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quarta-feira, 19 de maio de 2010

Padre Werner a Serviço da Inteligência Gaúcha


Um dos principais temas do debate entre positivistas e católicos foi sobre quem deveria assumir a responsabilidade sobre a educação. Os positivistas entendiam que a sociedade deveria se organizar para cuidar do ensino, pois segundo Soares e Diniz da Silva (1992, p. 37), “o espírito científico seria indispensável à qualificação do ensino; a psicologização do procedimento didático capacitaria o aluno segundo suas virtualidades; a administração escolar e pedagógica racionalizaria o processo educacional” (Soares & Diniz da Silva, 1992, p. 37). Os católicos, por outro lado, defendiam uma colaboração entre igreja e estado, e que a formação de professores ficasse aos cuidados das instituições que observassem os princípios cristãos.




Os intelectuais católicos foram muito influenciados pelo Padre Werner von und zur Mühlen (1874-1939). Pe. Werner era um jesuíta alemão que servia à sua congregação em Portugal, vindo para o Brasil em conseqüência da proibição das atividades das congregações católicas naquele país. Foi orientador religioso de jovens intelectuais católicos entre 1923 e 1939, através de uma congregação chamada de Mater Salvadoris. Lecionou filosofia e psicologia para os alunos do Colégio Anchieta, uma instituição fundada e mantida pelos jesuítas, em Porto Alegre. Escreveu um estudo sobre o Livre Arbítrio, publicado em 1919, que alcançou grande repercussão, e as monofrafias Apontamentos de Psicologia de 1923 e Apontamentos de Filosofia de 1926. Pe. Werner tinha planos de escrever um tratado de Psicologia Geral, procurando para tanto a orientação de um importante psicólogo jesuíta, Joseph Fröbes (1866-1947). Fröbes, como muitos os psicólogos experimentais alemães de sua época, havia estudado com Whilhem Wundt. Fröbre, então, recomendou ao Pe. Werner a leitura de seu livro Lehrbuch des experimentellen psychologie (Volumes I e II publicados em 1922 e 1923), e do livro Experimentelle Psychologie do Pe. Johannes Lindworsky (1875-1939) publicado em 1922” (Rabuske, 1999, p. 288-289)15. Entre os jovens participantes das reuniões da Mater Salvadoris de Pe. Werner estavam Victor de Brito Velho e Armando Câmara. Brito Velho escrevera, em 1943, um artigo sobre o trabalho filosófico de Mühlen na revista Idade Nova e seria um dos primeiros professores de Psicologia em Porto Alegre. Armando Câmara foi professor de Psicologia na Escola Normal; reitor da Universidade de Porto Alegre entre 1945 e 1949; e da Universidade Católica entre 1948 e 1949.



Criação da Universidade de Porto Alegre



No início da década de 1930, foi constituída pelo Governo do Estado do Rio Grande do Sul uma comissão para organizar a Universidade de Porto Alegre. Entre os planos da comissão estava a criação da Faculdade de Educação, Ciências e Letras. O grupo católico, tomando conhecimento dos planos da futura Universidade, enviou um Memorial ao Interventor General José Antônio Flores da Cunha. Neste documento, datado de 1934, o grupo informava que estava organizando uma Faculdade de Educação, Ciências e Letras e entendia não ser interessante a abertura simultânea de duas faculdades com os mesmos cursos. Assim, o grupo estava disposto a desistir da organização de sua faculdade mas reivindicava que professores católicos fossem convidados para participar da organização da nova Faculdade, na futura Universidade de Porto Alegre. Os católicos argumentavam que os alunos da Faculdade de Educação seriam, em sua grande maioria, egressos de ginásios religiosos “onde dominam diretrizes ideológicas marcadamente espiritualistas e cristãs” sendo “moralmente funesta a ruptura dessa orientação” (Memorial Católico, publicado na íntegra no Correio do Povo, 1979, p.12, incluido em um texto de Diniz da Silva, e recentemente por Regner, 1993, p. 44). Ressaltavam, ainda, que caberia a essa Faculdade formar futuros professores para esses mesmos ginásios sendo natural que houvesse uma conciliação entre a orientação da nova Faculdade e dos ginásios. O Memorial (Diniz da Silva, 1979, p. 12) advertia sobre os perigos da “crise moral que empolga o mundo, originária de uma concepção naturalista e pagã da vida” e lembrava que a nova Carta Magna de 1934 reconhecia a necessidade de cooperação entre os poderes espiritual e temporal “na esfera da cultura superior”.



A reivindicação católica encontrou alguns obstáculos. Em primeiro lugar, o Interventor não se preocupou em dar uma resposta imediata ao documento. Em segundo lugar, a Comissão Organizadora da Universidade decidiu, em setembro de 1934, que os cargos de professores, vagos ou a vagar, e os títulos de livre docente seriam obtidos por provas de títulos. Na verdade, os católicos estavam em desvantagem na Comissão Organizadora sendo representados apenas por um docente que era o Prof. Ary de Abreu Lima (Regner, 1993). No entanto, cabe antecipar que o grupo católico foi o grande vencedor da disputa ideológica, bastando para isso comparar a lista dos signatários do Memorial Católico e a lista dos primeiros reitores da futura Universidade. Assinaram o Memorial os professores Raul Moreira, Frederico Dahne, Elyseu Paglioli, Ary de Abreu Lima, Normélio Rosa, Ruy Cirne Lime, Mário Bernd, Álvaro Magalhães, Adalberto Pereira da Câmara e Armando Câmara. Entre os signatários três deles chegaram ao cargo de reitor da Universidade: Abreu Lima na gestão 1939-1941, Armando Câmara na gestão 1945-1949 e Paglioli na gestão 1952 –1964. É interessante notar que Armando Câmara foi o primeiro reitor da Universidade Católica, futura PUCRS, no período 1948-1951 e por quase dois anos ocupou simultaneamente o cargo de reitor nas duas universidades. Ressalte-se, contudo, que numa antecipação ecumênica surpreendente para a época os católicos aliaram-se a um grupo de intelectuais da Igreja Metodista para levar adiante seus propósitos ideológicos (Trindade, 1982).



A Universidade de Porto Alegre foi, enfim, efetivada em 1936. Reunia a Universidade Técnica com as Escolas de Engenharia, de Agronomia e de Veterinária; a Faculdade de Medicina e as escolas anexas de Odontologia e Farmácia; o Instituto de Artes; e a Faculdade de Educação Ciências e Letras. Em 1947 sua denominação foi modificada para Universidade do Rio Grande do Sul e em 1964, juntamente com a grande maioria das universidades mantidas com verbas federais, passou a se chamar Universidade Federal do Rio Grande do Sul. A federalização da Universidade ocorreu entre 1950 e 1952 (Soares & Diniz da Silva, 1992). Para efeito de clareza, a abreviação atual “UFRGS” será usada quando se referindo a essa Instituição, em seus diferentes períodos históricos.

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